Hoje eu vi o filme "Eu Sou A Lenda", onde o personagem principal está sozinho em um mundo devastado por um vírus que matou 90% da população e deixou a maioria restante em sintomas similares ao da raiva. O interessante do filme para mim não foi isso, não que o filme seja ruim, foi que em uma cena, um humano (se é que esse tem o direito de portar tal palavra) infectado, raivoso e doentio como os outros que apenas mordiam e pulavam em vítimas, soltou alguns cachorros também infectados e igualmente transtornados para atacarem seu alvo, e naquele momento notei que esses seres infectados compartilhavam entre si uma convivência similar a humana, a mesma convivência notada em outras partes do filme onde esses seres apresentavam traços de liderança e estratégia.
Aí que veio a divagação, e quando vem ela tarda a sair embaladinha e arrumadinha nessas palavras que você está lendo. O personagem do filme analisava o comportamento dos humanos infectados como uma anti-evolução social, algo como uma anti-evolução humana, e é aí que me pergunto: o quanto nós estamos infectados?
Pense por um momento que no meio de São Paulo capital surgisse um homem que aparentasse como outro qualquer, mas que andasse de forma lenta, não tivesse pensamentos ambiciosos ou agressivos, e fosse muito, muito calmo. Agora pense que esse homem fosse atravessar uma rua altamente movimentada para tomar um café do outro lado, ou que ele resolvesse sentar na mesma rua para ver o sol se pôr. Qual seria a nossa reação a tal atitude? Ou melhor: qual seria a visão dele de nossas atitudes?
No melhor cenário ele seria ao menos arrastado para longe da rua, no pior ele seria assassinado por não funcionar no tic-tac do sistema. E como ele veria isso, veria da mesma forma que vemos esses seres ficcionais do filme, infectados? Raivosos? Anormais?
Uma vez me falaram a tal frase que muitos já devem ter ouvido:
Em terra de cego quem tem olho é rei.
E nessa análise, quem possui o olho? Nós ou o nosso visitante super calmo? Quem tem a razão ou a superioridade moral para falar em como o outro deve agir, ou seja, quem tem o poder de julgar?
Primeiramente vou esclarecer que não acho que estamos infectados de forma alguma, falei de forma hipotética, e em segundo lugar: essa anedota está completamente errada, quem tivesse o olho nunca, nunca seria rei, como os outros veriam essa visão, como a entenderiam?
Outro filme que também deve ser levado para essa divagação (para quem ainda não sabe eu sou um cinéfilo*) se chama "Um Estranho no Ninho" e trata de algumas estórias que se passam em um manicômio na década de 1960, onde ainda se praticava a lobotomia, que é basicamente pegar um doente mental considerado agressivo e realizar uma incisão em seu córtex frontal para que ele se torne manso, ou seja, abrir um buraco na cabeça de um doente para que ele se torne um retardado, perca a abilidade mental de falar, pensar e urinar no vaso sanitário, entre outros. Quantas pessoas perderam suas faculdades mentais por essa prática no tempo em que ela foi considerada correta? Aliás quantos doentes perderam suas faculdades mentais?
Não só a prática da lobotomia é uma prática imoral, quantas pessoas sãs ficaram todas as suas vidas presas em manicômios por thinking outside the box**? Um exemplo disso foi o homem considerado louco que acreditava na existência de germes e falava deles e as doenças que esses germes podiam causar, claro, alguns séculos depois descobriram que o homem estava certo, mas até lá ele já estava morto e já havia passado sua vida trancafiado (fato falado no filme "Os 12 macacos", um filme muito bom, muito misterioso).
A que ponto chega a capacidade humana de julgar por sua prepotência e pseudo-superioridade moral? Temos realmente o direito de dizer quem é louco e quem é são? A história nos diz que não, que podemos muito bem estar errados. Temos o direito de utilizar nossa idéia de superioridade moral pra transformar a Terra como bem quisermos sem se importar com os outros moradores ou mesmo com os outros humanos? Nesse quesito a própria lógica diz que não. Por exemplo, nós temos uma ciência que já chegou a descobrir que os outros mamíferos possuem um sistema nervoso similar ao nosso, e ainda assim colocamos um cabo USB na cabeça de um felino pra saber se o último lote de ração está agradando ou não, desconsiderando o fato que sabemos que está causando dor! E além disso sabemos por lógica que a natureza viveria sem nós, e que eles são mais merecedores da vida do que nós que somos destruidores natos, mas continuamos a destruir e a reproduzir.
Não se engane, somos todos cegos, eu inclusive, o título foi só para chamar atenção e citar a idéia do texto, e claro, a ceguisse tratada é relativa. Não somente somos cegos como ainda vedamos o que temos de visão, nesse caso mentalidade e consciência, constantemente, a fim de justificar atos que sabemos que são errados, desde queimar gasolina tendo consciência do aquecimento global até a utilização de bombas nucleares.
Não proponho que ninguém se rebele agora, que vire contra a humanidade, nao proponho nem que entendam tudo o que eu quis expressar, só tenho o desejo de que você leitor veja a vida de forma diferente, aliás quem sabe se um de vocês não tenha um olho enquanto todos os outros sejam cegos?
Agora que coloquei o contador de visitas no meu site tenho alguma noção da divulgação dos meus artigos, e peço para quem chegou a esse link e teve paciência para ler um post por inteiro que faça a gentileza de postar um comentário, que são o instrumento que me incentivam a postar.
Ontem foi o aniversário da minha comentadora oficial, e como um presente adicional escrevi esse post com idéias anti-violência a animais para que ela possa comentar a vontade.
E também para quem me conhece peço que não comentem falando meu nome.
*Cinéfilo: amante do cinema.
**A expressão americana thinking outside the box significa algo como "pensar fora do normal, do previsível", utilizada para incentivar criatividade.
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sábado, 12 de janeiro de 2008
Em terra de cego quem tem olho é... conflitante.
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10 comentários:
Realmente no mundo de hj estamos todos tão alienados com nossos compromissos ("problemas") que nem reparamos o quão presos estamos a modos ditos "corretos", a correria do relógio contra todas as vontades, e ngm consegue perceber o mundo a seu redor, cada um só vê e acredita no seu próprio certo e errado, e realmente ngm sabe o q seria o olho do rei!!!
bom. Sobre esse artigo, levo em conta o fato de que sempre qualquer coisa que fuja aos costumes da sociedade, seja humana ou qualquer outra, levará no fato da exclusão do individuo da mesma, você citou o exemplo da pessoa que descobriu os germes, mas existiram muitos outro, só lembrarmos da época da inquisição, onde grandes pensadores foram assassinados, pois tinham um pensamento diferente do habitual para a época e muito tempo depois pode se afirmar que estavam corretos. Acredito que apesar de ainda hoje existir muito disso, nossa sociedade esteja em busca de novas descobertas, coisa que vem se tornado menos constante, na minha opnião pela acomodação do pensamento na sociedade, e com isso esse preconceito tendeu a diminuir..
Atenciosamente
BRilhante, sua análise do filme foi extremamente brilhante! Só tenho uma coisa a dizer: UAUUUUUUUUU!
Mesmo apoiando sua análise do filme, em certas partes minha opinião é divergente.
Na minha cabeça, toda essa coisa de humano vem da sua necessidade que arranjar um objetivo para a vida, um rumo. Como se fossemos máquinas à espera de um comando : "vá descobrir a cura da aids". Essas "ordens" faz com que nos setimos importantes diante desse mundão. É aquela visão: "Quero revolucionar o mundo, vou enfiar chip nos animaizinhos!". Deprimente! E absurdo.
Há algum tempo eu também acreditava que cegueira era o momento em que não víamos as desgraças, iludidos com as futilidades cotidianas. Durante minha época no fundo do poço, eu percebi que era o contrário. Somos cegos quando pensamos - racionalmente.
Cego é quem tem dó de animais, mas bate no seu cachorro.
Cego é quem chora ao ver crianças espancadas, mas não tem a capacidade de pasar a mão na cabeça de um bebê de favela.
Cego é quem acredita que é diferente pelo simples fato de sofrer pelas pessoas da Etiópia.
DE que lhes adianta ver, sentir e nada mais?
Sim, eu cobro atitude!
Cegos são os conflitantes. O resto? O resto é resultado da busca por objetivos (citada lá em cima), da atitude como moda, dos prazeres.
Quanto a mim? Eu sou só um espírito cansado da vida. Um espírito reclamão, diga-se de passagem...
Isso também é um modo de realidade Virtual. A realidade de quem é cego é diferente da de quem tem olho. Cada um tem sua realidade, e nem precisam ser classes tão distintas assim.
Escrevi merda??
E o que o que o Édipo comentou, acomodação de pensamento, ´´e papel da Midia.
Até me lembrei de uma propaganda: "Sorte sua viver em uma época em que você é livre pra pensar", e eu acrescento, sorte nossa (detentoras do poder) conseguirmos fazer você não pensar.
Besteira?
E por fim, a respeito da loucura tenho tres livros pra sugerir:
A Historia da Loucura do Fulcalt. Ele faz uma analize desgraçada do que é loucura, pra quem é loucura, e se existe loucura.
Quincas Borbas, Machado de Asis. Totalmente inspirado na psicanalize de Freud
O Lobo da Estepe, Hermann Hesse. Expressionismo Alemão. Pesado. Melhor livro do mundo. Até agora o livro da minha vida.
Me empolguei.
"Cego é quem acredita que é diferente pelo simples fato de sofrer pelas pessoas da Etiópia."
Perfeito!
Quanto aos livros, estou lendo um de contos do Hesse, e estou gostando muito, já li um trecho do lobo da estepe e vou ler o livro mesmo daqui a uns dias.
Cara, psicanálise também me interessa muito, Quincas Borba também está na lista.
Gostei muito dos comentários galera, é bom saber que tem gente lendo as minhas pirações. É real, não falei da inquisição, devia ter falado.
Dê-se crédito. A gnt comenta, porque gosta das verdades - e afins - descritos aqui.
Olhando pra este espaço, me dá esperança de que a internet seja aliada para a informação real dos jovens o/
Já que você pediu. Cheguei ao seu site através do travian. Eu vi o link no perfil de alguém abri e coloquei em "meus favoritos", pois estava sem tempo para ler. Há pouco estava vasculhando os "meus favoritos" e achei o blog.
Continue escrevendo, você faz isso muito bem.
A respeito do contador eu estou lendo através dos feed, portando não serei detectado.
Adorei esse post! Colocou em evidência os maiores problemas que o ser humano tem com a natureza e vice-versa.
Não só somos uma raça cega, mas como temos a certeza de possuímos uma valiosa visão. Essa certeza é tão errada que só vemos o tamanho de nossas atrocidades depois de cumpridas, depois quando os efeitos caêm sobre nós, e não falo só sobre o degrado do meio ambiente não.
Com relação ao preconceito, é claro que existem pessoas céticas ao extremo quando falamos de algo que não conhecemos, como o caso dos germes, mas será uma das epidemias da humanidade mais difíceis de se curar, já que a maior parte de nossa formação vem da sociedade onde vivemos. E graças a isto, no nosso mundo quem tem olho é taxado de maluco, e levado por manicombios.
O SEU POST É SIMPLISMENTE FANTASTICO, ESPETACCULAR. EU ESTAVA PROCURANDO UM EXEMPLO PARA MINHA MENSAGEM COM O TEMA: DEFICIENCIA ESPIRITUAL. ENCONTREI NO SEU POST, NAO UM SÓ EXEMPLO, MAS UMA FONTE DE EXTRAÇAO DE VARIAS IDÉIAS CONCERNENTE AO ASSUNTO. PARABÉNS, VC TEVE UMA INSPIRAÇAO INCRIVEL, DIRIA ATÉ MESMO DIVINA. QUE DEUS CONTINUI TE ILUMINANDO, ESTOU FELIZ POR SABER QUE NESSE MUNDO AINDA EXISTE HUMANOS...COMO VC...
Tardei a ver este último comentário. Sinto-me honrado!
Gostaria muito de saber que fim deu seu trabalho sobre "deficiência espiritual", mas há um detalhe, desconcertante, eu diria, nisso tudo: eu não sou religioso, aliás, sou o oposto do religioso. Mas a moral e a religião não são sinônimos, amigo leitor. E nunca serão. Entrando nesse assunto de cabeça, devo dizer que a palavra "espírito" vem do grego "respirar", que na época era algo completamente distinto de alguma ciência, obviamente. O que quero dizer com isso é que não há necessidade de crer em um poder maior para sentir piedade ou indignação nos causos de nosso mundo, e é por isso que me estranho quando leio que fui iluminado por Deus.
Mas fico muito feliz em ler este comentário, e repito: Sinto-me honrado.
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