quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

A torta de abacaxi.

"Amor, você trouxe a torta de abacaxi que eu gosto?" Falou alto sua mulher, saindo do banheiro com a toalha em seus cabelos, irrompendo em um baque os pensamentos do homem, que só pensava no livro, questionando se havia montado certo o dispositivo.
O homem relutou, dizendo estar cansado de seu trabalho, queria descansar, mas sua mulher insistiu que ele saísse para ir buscar a tal torta. Não era surpresa, ele sabia o que o aguardava, tinha premeditado a situação. Vestiu seu paletó e começou a andar, e enquanto saía de seu quarto sentia a ansiedade se tornando presente em seu corpo.
Detestava o homem sua casa, seu covil particular, mas pouco se importava, iria se sentir bem em alguns minutos. Tentou trocar algumas palavras com sua filha antes de sair, tentativa falha, já que essa tinha toda a sua atenção presa a seu computador e toda a vida que esse continha. E o homem não se via em sua filha da mesma forma que não se via naquela casa, mas isso pouco importava naquela hora.
Saiu da casa e ao fechar da porta viu que nada mais o impediria, já havia traçado seu objetivo para aquela noite e não mudaria seu cronograma. Sentou-se em seu carro, sua ansiedade agora crescia, e ele dirigiu até a praça perto de sua casa, como planejara.
Então o homem saiu de seu carro e andou até um banco da praça, onde sentou, observando atento o movimento ao redor, e foi quando avistou o banco que estava procurando com os olhos, do outro lado da praça, e viu um homem sentado no banco em questão, um homem de terno, lendo um jornal. Por um momento pensou: "Um homem como eu." Mas logo concluiu que isso era um tanto improvável.
Então, como havia previsto, ele levou a mão ao bolso e tirou o pequeno controle, controle que havia montado algumas horas antes, suas mãos tremendo não de medo, e sim de excitação, como as mãos de uma criança prestes a receber um presente. E então ele mirou brevemente o controle com os olhos e apertou seu botão.
O som da explosão ecoou pela pequena praça, os homens e as mulheres que estavam perto do local, que agora pouco lembrava o banco de madeira que um dia foi, transitavam para longe do mesmo e se perguntavam, alguns aos gritos, o que havia acontecido.
E o homem de paletó observou todos os acontecimentos. Não se importava com a explosão, tampouco com a vítima no banco da praça, "pessoas morrem todos os dias", pensava. O sangue e os destroços tinham lá sua beleza, sua arte, mas sua excitação verdadeira ainda não o tinha atingido.
E foi então que ele observou as dezenas, talvez centenas de pessoas que transitavam como zumbis por aquela praça, em suas rotinas cegas. Todas elas, sem exceção, haviam sido atingidas pelo espetáculo da noite, todas elas haviam recebido um baque em suas consciências, aquelas pessoas que andavam com pressa, pensando no trabalho, na família, escravas de suas próprias rotinas impensadas, todas elas haviam recebido uma estória a contar, uma nova perspectiva de vida, um motivo a faltar o trabalho, mas principalmente, todas elas haviam recebido uma surpresa, e o homem de paletó viu o presente que ele havia dado a todas essas pessoas, e isso o encheu de contentação, mais do que isso, ele se viu repleto de uma sensação de missão cumprida.
Mas o homem de paletó não podia pensar no espetáculo que causara a todas aquelas pessoas, ou como aquilo o fazia sentir-se bem, tampouco podia pensar no livro sobre explosivos que se encontrava em sua pasta, ele tinha de aproveitar aquele momento por só mais alguns segundos, somente mais alguns segundos de prazer e liberdade, antes de ir comprar a tal torta de abacaxi e voltar para a sua casa.

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5 comentários:

Anônimo disse...

Enredo muito bom!

Anônimo disse...

Eu diria que o enredo é muito bom, mas como o leitor acima já o fez eu me limito a dizer que não gosto de torta de abacaxi, mas a minha mae diz que faz bem à saúde.

Anônimo disse...

Então, como havia previsto, ele levou a mão ao bolso e tirou o pequeno controle, controle que havia montado algumas horas antes, suas mãos tremendo não de medo, e sim de excitação, como as mãos de uma criança prestes a receber um presente. E então ele mirou brevemente o controle com os olhos e apertou seu botão..

Por um momento eu pensei que era a estréia de: "Click 2, O Retorno".
suhahsuahsua

Sei lá..
Não entendi muito bem o objetivo desse texto mas.. o que vale é a intenção..

Anônimo disse...

UHAhuAHUhuAHA
O Clic do Manara???
hahhahhaha
muito bom!!!

Anitcha disse...

Pensar na "brevitude" da vida não é sinônimo de sofrimento, quanto mais um a lição. PElo menos não pra mim.

Sim, é um espetáculo! Alguns segundos de um gloria eterna. =)