-A vontade do pai! A vontade do pai?!
-É irmão, e se ele quer nós o faremos.
-Sim... - Assentiu o irmão mais novo, impedido pela falta de argumentos e pela tristeza do óbito.
-Sabe - falou o irmão mais velho, quebrando o silêncio -, as vezes acho que foi por isso que ele desenhou essa sala assim, desde a sua criação.
-"O pai" era inteligente, e sabia arquitetar suas construções como nenhum outro, mas pensar que ele tinha organizado tudo isso, desde tão cedo, bobagem!
-Você Marcos, não acha que ele poderia ter pensado nisso desde a construção desta casa?- Indagou o irmão maior ao sócio de longa data de seu pai, único homem a confiar a missão do dia.
-Talvez, quem sabe. - Falou o homem demoradamente, demonstrando sua tristeza.
Alguns minutos de silêncio.
-Ei, sabe essa idéia "do pai", de continuar existindo depois de...
-Sei. - Respondeu o irmão mais velho, cortando a frase que poderia muito bem não terminar, naquele momento encarar a mortalidade era uma missão difícil a seu irmão caçula.
-Então, é isso que me deixa injuriado, se ele realmente acredita nisso, ele não deveria estar lá, no enterro que foi preparado? Todas aquelas pessoas, aqueles discursos belos e honrosos, e no altar aquele caixão vazio. Aquele maldito caixão vazio.
Nenhum dos homens sabia o que dizer naquele momento, talvez nenhum estivesse totalmente em paz com o que estavam fazendo. Mais alguns momentos de silêncio.
-Olha esse piso, Bruno. De todas as suas construções perfeitas, impecáveis, esse piso sempre foi dessa forma, sobressaltado, e não foi só uma ou duas pessoas que me perguntaram o porquê disso, o porquê dessa única falha entre tantas obras. O pai sabe do que faz, ele mostra agora para nós que ele é impecável em tudo, e mantém sua humildade em mostrar somente a nós. - Falou o irmão mais velho, certo de que o seu pai já tinha arquitetado aquela situação anos atrás, naquele piso sobressaltado da casa que era certamente a mais bonita da cidade em que moravam.
-É o pai mesmo, tão genial e humilde. - Respondeu o irmão entre tristeza e aceitação.
Então os três homens, os irmãos e o sócio, realizaram o último desejo daquele que já tinha sido a pessoa mais brilhante que tinham conhecido, moveram o caixão contendo o corpo sem vida, o caixão verdadeiro, até a abertura recente do piso sobressaltado daquela linda casa, enterrando o homem naquele lar em confidência e humildade, de acordo com o falecido para "existir eternamente na vida de todas as pessoas que morarem na casa que um dia foi minha e que é minha melhor obra".
E fecharam a abertura no piso, encarcerando o gênio em seu destino escolhido, questionando-se se eles haviam cruzado a linha tênue que separa o genial do insensato, todos aflitos e decididos em manter esse segredo, como haviam prometido.
© Todos os direitos reservados.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Isso me lembra a estória do arquiteto que construiu o templo de Pandora, que guarnecia a famigerada caixa de mesmo nome.
Ele passou dezenas de ano planejando cada centímetro daquele templo. A princípio, acreditava cegamente em seu trabalho, e o fazia em fervor a adoração aos deuses Olímpicos.
No entanto, mesmo quando perdeu a fé nos deuses, continuou a trabalhar, e matou cada membro de sua família para implementar suas armadilhas.
Não que o "gênio" do seu texto tenha matado os familiares, mas pela linha de pensamento de Pascal, ele causou mal a eles.
PS: Sou problemático, e deletei um comentário igual a esse devido a um ou dois erros gramaticais.
Não vejo nada de absurdo no enterro. Tá certo que eu não gostaria de concviver com um caixão escondido.
Grandes mentes sempre trazem desejos extravagantes.
A linah de seu pensamento nós faz perceber aos poucos o contexto vivido.É como se a névoa cessasse no ultimo trecho.è jóia
Postar um comentário