quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Projeto Ricky Fitts: Adjetivando a beleza. I

O Projeto Ricky Fitts consiste de uma série de atestamentos que descrevem – ou tentam descrever – a beleza do mundo. Tais atestamentos, curtos, darão ênfase à descrição de cenas soltas, por vezes desconexas, de eventos e acasos que por ventura ocorrerem no dia de sua escrita ou que forem despertados pela memória.
O nome é homenagem ao personagem Ricky do brilhante Beleza Americana (American Beauty – 1999), e o projeto em si é inspirado em, dentre outras maravilhosas belezas, “Noites” - http://discutindocommeusmonologos.blogspot.com/2009/08/noites-parte-i.html .
Ricky Fitts, em sua cena histórica, sob atuação de Wes Bentley, descreveu a beleza do mundo ao mostrar uma sacola plástica, que estava “tipo dançando” com ele, por quinze minutos ao vento.
Todas os fragmentos – nomeados “Coplas” – serão respostas à questão: “A beleza é?”.

Primeira Copla.
É uma piadinha feita à beira de estrada. Um relance de uma fantástica dança. Uma foto de sorrisos, uma mesa de boas conversas e bons humores, uma música de fundo e uma cerveja gelada. É o que se depara quando se acorda após a fadiga e o sono, após a chegada. A maravilha de uma conversa num carro de madrugada. É uma frustração tola e cômica comparada ao dia incrível que se passou. O som da quebra de um chocolate meio amargo, e um filme sobre as mais humanas das emoções e dos anseios.

Segunda Copla.
É uma costela em fogo de chão. É a fumaça da madeira queimando, através das cinzas e da visão difusa pelo calor. O arder nos olhos do quente. É baixar a pressão e ver o mundo com olhos de calmaria, não ver o tempo passar e não sentir o sorriso subir. Um sanduíche com nacos espessos de cebola. É a conversa que se tem com um recém-descoberto sábio, e os olhares de conforto e desconforto que ele o passa. A menina que interrompe conversas e a encarada que seu amigo recebe, o humor que isso produz. A mais inquietante vontade – e nostalgia – de simplesmente estar com uma pessoa especial. É tatear o bolso à procura de ouvir àquela música que está na sua cabeça. É sol, gramado e cansaço. É uma imagem que diz magistralmente o que infinitos escritos não comporiam. O sorriso por um apreço recebido, são os escritos em um computador silenciado.

Terceira Copla.
É o medo gostoso que cresce pela espinha ao tomar-se em mãos um automóvel em alta velocidade, a sensação de poder e de merecimento ao saber que vidas humanas estão a seu controle. É o pairar do cosmos sob o olhar daqueles que mal o conhecem por motivos de luzes artificiais; a doce sensação de parecermos tão pequenos, ao depararmos com um céu lindamente estrelado. A forma com que azeite sob carne de onça toma uma cor de amarelo desbotado ao receber gotas de sumo de limão, e como o sal que despenca sobre este lembra neve caindo em um lago de ferrugem.

Quarta Copla.
É uma viagem para um lugar ensolarado. A sensação da pedra dura e fria de arenito ao pousarmos as costas sob a parte seca de uma cachoeira, e a forma com que o sol nos cega e nos ilumina, em diversos sentidos. É um pássaro azul, uma coleção de borboletas amarelas que insiste em sobrevoar a beira de um rio aparentemente infinito. Um passear de barco em que, como no Louvre, se perdêssemos o tempo sensato a ver cada um dos pontos verdes, marrons, amarelos ou azulados, de suas peças de arte, amontoadas sobre morros imponentes e plantas aquáticas graciosas, perderíamos uma vida toda e por fim nada perderíamos. É o correr de um lagarto, uma brasa e um copo d’água de poço. É música, sorrisos, e uma noite perfeita por entre uma brisa leve de primavera.

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Um comentário:

Monologuista Acompanhado disse...

Suas frases ficaram perfeitas. A combinação de palavras ficou ótima.

Abraço.